terça-feira, 19 de março de 2013

Descobrindo-se

Ela entrou no quarto, desligou a luz e pensou: seria mais fácil se a vida fosse menos amarga. Queria poder sentir de outra forma, mas não via como. Ela era triste. Não escolheu ser assim, apenas era. A vida escolheu por ela. Ficou parada na escuridão por um tempo, pois não queria ver seu reflexo choroso no espelho pendurado na parede. Nem ao menos o reconheceria. Ela não era quem outrora pensava ser. Não era tão forte, tão bonita, tão decidida. Sentia-se mais como uma alma perdida.

Ah, se ao menos soubesse um jeito de deixar tudo um pouco mais doce! Não conseguia achar uma coisa sequer que valesse a pena àquela altura. Tudo parecia muito cinza. Afinal, ela não era mais nenhuma menina, nem uma jovem esperançosa. Já beirava os 30 anos e não havia alcançado nada que sonhava quando era criança. "Como eu cheguei a esse ponto, no fim das contas?", costumava se perguntar. Tinha feito oque podia, sem contar com ninguém. Embora atraísse olhares, conseguia, de alguma forma, afastar-se de todos. Fazia isso inconscientemente, pois estava cansada de colocar no rosto um sorriso que não era dela. Pra quem estava fingindo, afinal? A cobrança por felicidade a irritava sobremaneira. Não entendia essa necessidade de todo mundo de ser feliz o tempo todo. Seria impossível, inimaginável! Se ao menos alguém se importasse de verdade, perceberia que ela só precisava de alguém que não exigisse mais do que ela podia dar.

Em um verão qualquer, resolveu que não voltaria mais para o emprego. Ele não lhe satisfazia, de qualquer forma, e o dinheiro da pensão dos falecidos pais era suficiente para o seu sustento. Resolveu largar tudo, percebendo que não tinha muito o que deixar para trás: um trabalho ruim, uma casa alugada, um cachorro... e frustrações. Viajou levando na mala algumas roupas, um caderno, e - quem diria - uma pontinha de esperança, a qual acreditava ter perdido muito anos antes.

Indo a tantos lugares, acabou descobrindo que não tinha um lar. Seu lugar era o mundo inteiro. Não importava onde fosse, sempre conseguia encontrar algo de bom. Era como se compensasse a falta de beleza dentro dela com a beleza daquilo que a rodeava. Conheceu pouca gente, mas o suficiente para descobrir o que era amar. Escreveu muito, mas nunca tanto quanto gostaria, nem tantas páginas quanto levaria para descrever tudo que dentro dela se passava. Não, a sua história não tinha grandes feitos, nem riqueza, nem reviravoltas inesperadas, príncipe encantado ou felizes para sempre. Mas, no final, ela descobriu quem ela era. E isso era tudo que precisava para adoçar seus passos e seguir em frente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário