segunda-feira, 29 de abril de 2013

Muito aquém das letras


Remexendo as gavetas durante a mudança, achou, lá no fundo, um pequeno bloco. Capa vermelha, folhas já amareladas, gastas. Estava repleto de poemas de sua autoria. Pôs-se a ler. Relembrou os tempos em que escrevia quase todos os dias, em lugar qualquer. Saia fácil, as palavras vinham naturalmente... até o dia em que começou a questionar o que colocava no papel.

O seu maior erro foi tentar racionalizar a criação. Perdeu o fio da meada. Acontece que não sabia de onde vinha tudo aquilo. Não era ele... era invenção. Ele era só mais um cara, com uma vidinha sem graça, igual a milhões de outros. Roberto. Não era um apaixonado, embora descrevesse com perfeição o ardor da paixão. Não tinha uma amada, embora inventasse musas inspiradoras tão perfeitas que mais parecia um romântico da primeira geração. Não sabia contar piadas nem ser irônico, embora conseguisse construir sátiras aclamadas pelo público e crítica.

Costumava sentir inveja daqueles que escreviam sobre a própria vida, amores vividos ou a respeito da beleza do cotidiano. Seus textos se distanciavam da rotina. Eram idealizados, puramente ficcionais. Não conseguia encontrar dentro de si ódio ou amor suficientemente intensos, que transbordassem para o papel. Era morno. Divagava sobre o tudo e o nada, mas jamais sobre si. Os poetas pareciam ser loucos, insanos, mas ao mesmo tempo decididos. Sabiam quem eram, ou pelo menos quem queriam ser. Roberto nunca soube. Costumava ser apenas poeta. Hoje, nem isso.

Idoso, aposentou-se não só da literatura, mas também do intelecto. Se já não escrevia mais, nem tampouco lia. Os livros serviam apenas para juntar poeira e encher a estante do quarto. Ao empacotá-los, no entanto, separou a obra de Fernando Pessoa. Queria dar uma folheada em algo no avião, e achou que, se ia voltar a praticar leitura, devia fazer direito. Seu autor favorito certamente iria lhe motivar. Melancólico, triste, porém com uma pinta de verdade. Um fingidor, como o próprio se nomeia. Mas um bom fingidor. Um homem de dores. Muito melhor que ele próprio, que transitava por todos os sentimentos, sem sentir nenhum. Começou a leitura:

"O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente."

A dor que deveras sente? Deve ser por isso que nunca chegou a ser bom escritor como Fernando. Nunca chegaria aos pés de um que consegue viver os personagens, com toda sua delicadeza e entusiasmo. Não sentia aquela dor. Nem alegria, medo, culpa, rancor. Enquanto os personagens descabelavam-se, ele apenas canetava, canetava, canetava... Tinha que nascer com aptidão para algo, e a dele era essa. Rabiscar, construir, descrever, revelar. Dar vida à algo. Algo que poderia existir, sim. Mas nunca dentro dele. Afinal, Roberto é só mais um. O texto é muito mais que isso. É único. É maior que ele.

domingo, 28 de abril de 2013

Essa tal esperança


"Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas." (Fernando Pessoa)

A gente cresce ouvindo que pode ser o que quiser. Astronauta, ator, médico, motorista de caminhão... ou até mesmo um vagabundo. Fazem uma espécie de lavagem cerebral de esperança. No entanto, os anos passam e a cobrança por resultados começa a ser pesada demais. Com isso, a maioria dos sonhos vão sendo substituídos por outros mais realistas, menos fantasiosos e que tragam dinheiro, estabilidade e, quem sabe, satisfação.

O problema é que, nesse meio tempo, existem duas formas de se perder. A primeira é abrindo mão do ideais radicalmente, para dar lugar ao lucro e poder, ou simplesmente por preguiça de correr atrás do que quer. A segunda, que particularmente acho mais difícil de julgar, é insistir tanto em um sonho a ponto de esquecer de viver as outras oportunidades. Culpa daquela velha lavagem cerebral... as pessoas repetem mil vezes "não desista", embora poucas realmente se importem se você o fizer.

Começa, então, uma espécie de corrida contra o destino. Quebrando a cara como quem troca de roupa. Depois de um tempo, nem dói mais. Vão se acostumando com o fracasso, já que essa busca pela felicidade gera a falta dela. Ao contrário do que dizem, olhar sempre pra frente pode ser ruim. Olhe para os lados e, se preciso, para trás. Reavalie. Procure novos caminhos. Um deles dará certo. Possivelmente aquele pelo qual você nunca pretendeu seguir.

Muitos dos sonhos são nobres, sim. E se realizam. O problema é que outros foram feitos para ser apenas sonhos, nunca realidade. E nisso não tem perseverança que dê jeito. É preciso seguir em frente e construir uma perspectiva nova. Quem sabe uma dez vezes mais bonita? Ter fé num objetivo é maravilhoso, mas não tanto quanto ter fé na vida. Tente, caia, levante, tente mais uma vez. Se não der, talvez seja hora de mudar o foco. Assim, não desgastamos demais a esperança - que é a última que morre, mas morre também. 

Aos 35 anos

- Uma bebida sem gelo, por favor - Pediu ao garçom, tocando suavemente os longos cabelos castanhos.

Saiu de casa querendo ficar um pouco sozinha, conversar consigo mesma enquanto tomava um drinque pensando sobre o seu casamento, emprego, sentimentos... enfim, todo aquele entrelaçado de pessoas e situações do seu cotidiano. Depois de alguns minutos, entretanto, encontrou com uma amiga de infância, também sozinha, que passava por ali para comer algo após um longo dia de trabalho.

- Júlia? - Perguntou a amiga, num tom de surpresa.
- Oi! Quanto tempo!
- Pois é, menina. Sabe como é, com tantas obrigações, a gente acaba sem tempo pra nada.

A amiga acabou sentando na mesa, o que estragou os planos de Júlia de conversar consigo mesma e pensar na vida, mas a levou a pensar sobre outra coisa: o tempo. A frase que, sem nem pensar, a amiga falou, a tocou profundamente. "A gente acaba sem tempo pra nada..." Será mesmo que tem que ser assim? Ficar presa à uma rotina cansativa e sem brilho? Deixar de viver o que a gente gosta, de estar com quem ama, escutar música, dançar, olhar nos olhos ou simplesmente não fazer nada, só curtir um pouco a preguiça do domingo. 

De repente começou a se achar velha demais. Percebeu que já tinha 35 anos. Gelou. Ontem mesmo era 25... passou rápido demais. Ela ficou sem tempo de comemorar a vida. Tinha que cuidar da casa, dos dois filhos, marido e ainda do seu emprego mais ou menos, cujo salário mal dava para pagar as contas. Viviam apertando daqui e dali, visto que o salário do marido também não era grande coisa, e queriam juntar dinheiro para comprar uma casa e sair do aluguel. Onde estava a graça de tudo aquilo? Dez anos atrás tudo parecia mais divertido e promissor. Vai ver que o tempo leva consigo também a magia. 

Se despediu da amiga e, no trânsito de volta para casa, ligou o rádio. Sentiu os acordes tocarem lá dentro da sua alma já esmorecida pelo tédio. Percebeu que ainda estava viva. Ainda dava tempo. Afinal, só tinha 35 anos. 35 anos nos quais construiu não só a si mesma, mas a uma família. 35 anos que não deviam ser em vão. Ela ainda tinha muitos e muitos pela frente. Tempo suficiente pra viver, mas não pra desperdiçar. Para não acabar sem tempo pra nada, precisaria de mais do que uma bebida sem gelo. Precisava aquecer seu coração e seus sentidos. Precisava de um amor, um olhar, uma vida sem gelo.

terça-feira, 23 de abril de 2013

Sobre o dia mundial do livro e as delícias que este nos traz

Um livro pode ser um grande aliado, dependendo das mãos onde estiverem. Nas minhas, sempre foi como um passaporte. Viajar em todas aquelas letras, páginas com marquinhas do tempo e o cheirinho (de novo ou de velho) é como um escape. Independente do estilo, afinal gostoso mesmo é ler o que a gente quiser, sem ter que dar satisfação pra ninguém. É um alimento pra alma, e isso é algo pessoal, só nosso. 

Hoje, o dia do livro é comemorado no mundo inteiro, uma homenagem à dois grandes autores, William Shakespeare e Miguel de Cervantes. Sei que pode parecer clichê falar sobre toda a magia da leitura no dia do livro, mas alguns clichês são cheios de sabedoria, e aí vai um deles:

Um país se faz com homens e livros.

E um homem se faz com livros, amor e exemplo. A literatura representa um delicioso degrau em direção ao conhecimento. E também para perpetuação deste. Acho que a melhor parte é saber que, depois de mim, várias outras pessoas poderão ter acesso àquele conteúdo, afinal, ele está ali. Impresso. Irredutível. Pronto para ser lido, esperando alguém que o use como o aliado que ele pode ser. 

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Mais amor, por favor


"Duvida da luz dos astros         
De que o sol tenha calor
Duvide até da verdade
Mas confia em meu amor."

(W. Shakespeare)






Já é segunda feira e eu ainda não consegui dormir, o que em parte é culpa da minha rotina de não fazer nada, mas também consequência do infinito de pensamentos que passam pela minha mente. O que sustenta a vida, afinal? Por que se viver for só mesmice, só formalidade, desculpa, mas não acho que vale a pena.
Se não tiver um pouquinho de magia escondida, perde a graça. O amor é a única resposta que me parece satisfatória. Ele está dentro e fora de mim. Está em todo mundo, acredito. De formas diferentes, mas está. O que acho estranho é  que, embora muito claro, o amor está, ao mesmo tempo, distorcido e discreto. Ele pode ser encontrado na maioria das músicas, está estampado nos outdoors e novelas, nos livros e capas de revista. Mas cadê ele no dia a dia? Cadê ele nos sinais, na rua, no cotidiano, nas pessoas? Onde encontrá-lo no amontoado de pessoas sozinhas em seus carros, pedintes batendo no vidro, uma criança dormindo na calçada? Nos olhos da menina que perde a inocência quando algum engraçadinho, impiedosamente, quebra seu coração ou do filho que vive com os pais, mas, no fundo, se sente órfão? São olhares que não brilham mais. O mundo não pode ser só isso. Não é. E, se for, espero nunca descobrir a verdade. Por que eu enxergo de outra forma. Eu vivo para o amor. O resto é detalhe. O resto se desgasta - o amor não. "Quanto mais se dá, mais se tem."

domingo, 21 de abril de 2013

Em meio à pressa, paro para tentar me encontrar

"Mas, se eu lhe disser quem sou, você pode não gostar. E é tudo que eu tenho."

Dizem que uma mentira repetida várias vezes se torna verdade. A gente sempre escuta dizer que o tempo leva tudo, que cura, que tudo passa ou coisas do gênero. Mas o fato é que dia vai, dia vem, os anos passam e tudo vai se acumulando dentro de mim. As coisas vão acontecendo, pessoas novas vão chegando e de certa forma vou absorvendo informação demais, sentimento demais, amor demais. As vezes me sinto perdida de mim. Como se a imagem que os outros têm de mim falasse mais alto, sabe? Por isso venho aqui e escrevo, meio que converso comigo mesma, e tento absorver tudo que eu sou, penso e quero. As vezes me acho engraçada, quando vou olhar as coisas que eu já escrevi antes, ou algum rascunho que eu não publiquei. Fica muito claro que eu tenho uma pressa enorme de ser completamente feliz. Fico ansiosa para conhecer pessoas novas, diferentes, mais parecidas comigo ou o oposto de mim, mas que sejam realmente cheias. Estou tão cansada de pessoas vazias... As vezes dá uma vontade de ir embora, ir pra longe, pra lugar qualquer procurar essa felicidade que eu tanto espero. Depois me vejo presa demais à tudo que me cerca. Mas será que isso tudo me completa ou sou só eu me enchendo de mentiras, de algo que só existe na minha cabecinha? Quero fluir, mas não me sinto assim. Me sinto perdendo tempo, como aquela avó que diz que os anos passam cada vez mais rápido. Já disse Cazuza que "o nosso amor a gente que inventa pra se distrair", mas esse vai e vem não me distrai mais. Eu estava certa de que esse seria o MEU ano, pra os MEUS sonhos, MEUS amores, minha vida. Tudo começando a mudar pra ser do jeito que eu sempre quis. Não tenho mais tanta certeza. Nem sei se consigo mais ser tão otimista como eu era antes, tão menina, tão entregue à minha estranha visão da felicidade: nem muito, nem tudo, só o essencial. O que eu julgo essencial, no entanto, muda de cara o tempo todo, o que me faz sentir a piada personificada, a garotinha perdida, a confusão. Será que um dia eu vou ser mesmo completamente feliz? Ou só a pressa me perseguirá por todos os dias, como um fantasma que me faz perder o sono? Estou tentando tornar tudo mais colorido. Me sinto cansada, mas a Jade de verdade me persegue: tímida, ansiosa, sonhadora, romântica, teimosa, confusa... ela poderia se entregar ao preto e branco? Poderia perder a fé, deixar a vida passar? Logo eu que nasci com tantas manias e sonhos, a própria princesinha desengonçada, tentando caminhar seguindo o dedo de Deus? E, pensando nisso, as minhas lágrimas misturadas ao sorriso doce e aos olhares verdadeiros ganham um sabor novo de esperança e de coragem. Sou só eu. A velha eu. E a velha eu não iria desistir. Até por que carrega uma certa pressa dentro de si.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

A liberdade de ser quem é (ou a perda dela)


Sabe quando você conhece uma pessoa nova? Todo aquele cuidado para não ser muito fechada, mas também não muito expansiva. O medo de falar demais, deixando que a pessoa enxergue além das suas molduras. As perguntas de sempre... a idade, os hobbies, o que você faz da vida? É como se aquela pessoa estivesse tentando te encaixar em alguma padrão, e vice versa. Mas por que não tentar se contentar simplesmente com quem você e outro são?

A verdade é que as pessoas se acostumaram a se esconder. Ou se proteger, quem sabe. Vai ver que isso é consequência dos corações machucados e das decepções que todo mundo tem em algum momento da vida. Lembro de tantas vezes ter tentado ser aquele tipo de pessoa misteriosa, que todo mundo tenta desvendar. Elas nunca parecem sair machucadas. Nunca se sabe o que se passa na cabeça delas. Talvez sejam felizes, tristes, tímidas ou apenas queiram fazer um charme, sei lá.

O fato é que nunca consegui nem chegar perto. Quando via, já estava contando minha vida para alguém que conheci mês passado, mas que já achava que podia confiar. Já estava escrevendo um texto sobre um fulaninho que eu achava que gostava, mas depois de uma semana via que era só mais um. Ficava vermelha quando era centro das atenções. Ria quando tinha vontade e, por mais que tentasse, não conseguia segurar o choro, mesmo quando não queria que ninguém percebesse que eu estava mal. 

Percebi, no entanto, que eu sou livre para ser quem eu sou. Que mais posso querer além disso? Qual poderia ser o resultado de negar a si mesmo? Infelicidade, é claro. Há um tipo de felicidade outorgada que nos reprime, quer nos igualar. Já passou da hora que esquecer os esteriótipos: a mocinha da novela, a vilã do filme, a bruxa que voa na vassoura, a velhinha solitária, os intelectuais, hippies, superficiais... Ninguém é só isso. Sob qualquer circunstância, apenas uma palavra pode nos definir: humanos. Únicos, livres, complexos. Só isso. Tudo isso. 

terça-feira, 16 de abril de 2013

Fácil demais


Seria fácil amar você. Ouvir seus segredos, seus medos, seus sonhos. Seria fácil amar os seus defeitos, mesmo aqueles que eu ainda não conheço. Seria fácil te ouvir falar no meu ouvido que sou eu que você quer, mesmo que significasse mais pra mim do que pra você.

Seria fácil ficar com você todos os dias. Mesmo nos dias ruins. Seria fácil te ouvir cantar para mim, enquanto olhava nos meus olhos. Seus olhares seriam fáceis demais de adorar. Assim como seus sorrisos e suas lágrimas, suas palavras doces e também as grosseiras, a cara emburrada, o corpo preguiçoso.

Seria fácil amar você da manhã à madrugada. Eu amaria você mesmo que você nem percebesse ainda que sentia o mesmo, que não ousasse tocar na palavra amor. Mesmo que você fosse imaturo, muitas vezes desatento, alheio, distante. Seria fácil sentir ciúmes, raiva, insegurança. Afinal, quando se ama, tudo isso vem no pacote. Seria mais fácil ainda ficar perto quando você sentisse frio, quisesse conversar ou apenas saber que não estava sozinho. Seria fácil ser a menina do seu lado, se não houvesse outra no lugar. Seria fácil ser quem você quer, gostar de um todo, não só de uma parte sua. 

Seria fácil amar mesmo as nossas brigas. Mesmo os desentendimentos, desencontros e ciúmes bobos. Nos dias ensolarados, nos momentos mais bonitos, nas festas, na sua casa e na minha. Em todo lugar, parece mais fácil do que eu queria que fosse. Talvez um pouquinho de dificuldade fizesse bem. Mas você facilita demais, sendo simplesmente quem você é. 

Bastaria que você dissesse que sim, e tudo seria fácil demais. Seria fácil amar você quando eu estivesse cansada demais para sentir qualquer coisa. Nos dias corridos e no meu sono, nos sonhos que você insiste em aparecer. Nos meus textos, nos meus pensamentos e lá no fundo, sei que seria.

Fácil demais amar você se você pedisse, ainda que não usasse palavras. Fácil demais por ser você. Só você. Mais nada: nem palavras, nem pessoas, nem coisa qualquer. Pra quê complicar? Se parece tão fácil amar você, deixa do jeito que tá. Quem sabia um dia, por manobra do destino, eu venha a te amar. E que seja doce, simples, puro: como o aroma da manhã que nasce pra nós dois.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

As pequenas grandes alegrias da vida

Quando reclamávamos com meu pai para ele abaixar o volume do som, ele dizia que uma das grandes alegrias da vida era escutar uma música que você gosta. Eu, com meus 9 anos, não entendia muito bem o que ele queria dizer - apenas fazia que sim com a cabeça, sem querer contrariá-lo. No fundo, eu duvidava que algo tão simples pudesse ser uma grande alegria da vida. Acostumada com minhas historinhas de heróis, príncipes encantados e mágica, eu esperava ansiosa para o "felizes para sempre". Isso, sim, parecia grande.

Com os anos passando, os contos de fadas foram sendo deixados de lado. Eis que a vida real vai, aos poucos, mostrando a face. A simplicidade mostra o seu valor e, de repente, a gente percebe que felizes para sempre não existe, pelo menos não do jeito que parecia ser. Início, meio e final feliz é por nossa conta, é construído tijolo por tijolo. Os versos da nossa vida vão sendo escritos e, ao longo deles, as pequenas alegrias se mostram grandes, enormes, indispensáveis! Seja o sorriso, o beijo, a companhia, uma página em branco esperando pra ser escrita, alguém escovando nossos cabelos... Tudo que se esconde no cotidiano e o torna mais leve, mais fácil de carregar.

Agora, olhando o céu azulzinho, combinando com o mar, eu sinto meu coração aquecer. Sinto que eu posso ser quem eu quiser. E que alegria poderá ser maior do que a liberdade? Que mais posso querer além de uma tarde ensolarada, uma rede para deitar e um texto todo pronto na minha cabeça, esperando para ser escrito? Ser livre pra ser quem a gente é está sem dúvidas na minha lista das pequenas grandes alegrias. Sabe, hoje tem poucas coisas que eu goste mais de fazer do que ouvir uma boa música, sozinha, deixando os acordes se espalharem pelo quarto e a meninice brincar, novamente, nos meus olhos. É, parece que meu pai estava certo.

sábado, 13 de abril de 2013

Embaralhada

Sabe quando uma coisa parece tão certa mas ao mesmo tempo tão errada? Eu sinto como se algo me prendesse a isso. Nos meus sonhos, nos meus sentimentos... em tudo que eu não consigo controlar, que se confunde, se embaralha dentro de mim.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Preferidinhas - Garotos

"Seus olhos e seus olhares
Milhares de tentações
Meninas são tão mulheres
Seus truques e confusões
Se espalham pelos pêlos
Boca e cabelo
Peitos e poses e apelos
Me agarram pelas pernas
Certas mulheres como você
Me levam sempre onde querem

Garotos não resistem
Aos seus mistérios
Garotos nunca dizem não
Garotos como eu
Sempre tão espertos
Perto de uma mulher
São só garotos..."

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Escrever: sentir, transbordar, libertar.


Redação sempre foi minha matéria favorita. Nas aulas da escola, eu ficava empolgada para o dia que nos mandavam escrever, geralmente uma ou duas vezes por mês. Lembro da minha ansiedade para saber o tema e construir o texto, tijolo por tijolo, palavra por palavra. Também adorava quando a professora corrigia. Era como se, enquanto avaliava aquilo que eu escrevi, ela estivesse reservando um tempinho só pra mim, para adentrar meus pensamentos, ler minhas linhas e entrelinhas e se transportar para o meu mundinho particular.

A única coisa que me incomodava era não me sentir livre pra escrever da forma que eu via o mundo e o carregava dentro de mim. Eu estava presa à todas aquelas regras, normas, parágrafos, estruturas... Eu não gostava da seriedade daquilo tudo. Escrever, pra mim, tem muito mais a ver com sentimento do que com razão. Bom mesmo é colocar no papel o que der na telha. Algumas vezes rimar, outras deixar tudo solto. Um dia fazer tudo certinho, com princípio, meio e fim, e no outro deixar tudo embaralhado. Afinal, quem disse que as coisas ocorrem sempre do mesmo jeito? Por que não começar pelo fim, voltar pra o início e depois contar os meados disso tudo? A delícia de escrever é isso! Poder transbordar aquilo que há dentro de nós: a organização, a verdade, mas também a bagunça, a loucura e tudo mais que houver.


 Não posso deixar de reconhecer a importância das normas, da rigidez da dissertação, do editorial ou da carta. Mas o meu maior prazer é o jogo de palavras, o mix de letras, de semântica, de fonética e de sentimento. O texto bom de escrever é aquele que carrega um pouquinho da gente, que leva consigo o brilho dos olhos, o sorriso dos lábios e a dor do coração. É aquele que faz a gente se debruçar sobre a mesa e rabiscar, rabiscar, rabiscar... nos permitindo não medir muito as canetadas. Pouco interessa o assunto, o tamanho ou a estrutura: ele próprio se explica, se apresenta, se vende, se lê.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Amanhecer

Abriu os olhos e sentiu o amanhecer aguçar os seus sentidos. O aroma da manhã era cítrico, mas ao mesmo tempo levemente adocicado, de um modo que a fez lembrar de seu próprio perfume. Sentiu-se encaixada no contexto perfeito. Que mais podia querer que uma manhã de sábado, com céu claro, cheirinho bom e uma mente vazia, ainda meio adormecida? Levantou lentamente, como quem não tem nada para fazer, em detrimento das tarefas que teria que cumprir antes da segunda-feira. Foi até a janela e olhou a rua, ainda quase vazia, com pouquíssimos carros passando para quebrar o silêncio. Imaginou as pessoas em suas casas, ainda dormindo ou acordando apressadas, preocupadas com os filhos, a casa e o emprego, alheias ao espetáculo do novo dia. Correria, trânsito, confusão, indiferença... tudo isso veio à sua mente, que em alguns minutos se encheu, deixando seus sentidos menos interessados, seu olhar mais vazio. Era como se o cotidiano arrancasse aos poucos a vida de dentro dela. Resolveu voltar para cama e voltar a dormir. Quem sabe assim conseguiria sonhar? Afinal, nos sonhos, toda manhã pode ser uma manhã de sábado: essas com amanhecer claro e perfumado, que trazem o brilho para o os olhos e a vida de volta pra ela.

domingo, 7 de abril de 2013

Paciência e lágrimas no guarda-roupa

Desde pequena, ao sentir meu queixo tremer, eu queria me esconder para que ninguém visse minhas lágrimas. Engraçado, acho que quando criança eu tinha mais vergonha de chorar em público do que agora. Talvez eu esteja me acostumando, sei lá. Mas eu lembro que, quando ficava triste, costumava me esconder dentro do guarda-roupa. Ficava lá sozinha, chorando, chorando, chorando, geralmente abraçada com minhas roupinhas de dormir. Eu achava que era meu esconderijo secreto, mas na verdade minha mãe sabia que eu estava lá o tempo todo, só que me deixava pensar que tinha um cantinho na casa onde ninguém me achava, que era só meu. Agora, eu quero ficar sozinha, mas não acho meu espaço. É estranho sentir a presença das pessoas que amo me incomodando, de um modo que não dá pra evitar. Fico até sem graça, por isso não falo nada, finjo que tá tudo bem, quem sabe assim fique bem de verdade. O problema é que não me cabe mais no armário. Queria um cantinho aconchegante pra chorar, procuro, procuro e não acho. Corro pro quarto, olho em volta, olho pra mim e pergunto pra Deus quando isso vai passar. Ele sussurra no meu ouvido pra ter paciência, pois Ele está cuidando de tudo. Escutou? Ele está cuidando de tudo! Não posso mais esquecer disso, portanto repito pra mim mesma: paciência, paciência, paciência...

Eu, em pedacinhos

Não que eu seja muito experimentada nas dores, mas acho que não existe nenhuma pior do que a que a gente sente aqui dentro. Sinto um peso, mas ao mesmo tempo um vazio! Vejo tudo se embaralhando, meus pedacinhos se espalhando pelo quarto, meu coração esperando para ser remendado e meu reflexo perdido no espelho. Me obrigo a levantar para sair juntando as peças, mas nada parece se encaixar como antes. Eu mudei. Você mudou. Todos mudaram. Talvez até a verdade seja nova. E por mais que eu queira, as coisas não dão nenhum sinal de que voltarão a ser como eram. Cabe a mim aprender a montar o novo quebra cabeças.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Algumas verdades que o dinheiro mostra


Existem várias maneiras de se conhecer uma pessoa, mas acredito que a mais rápida e eficaz seja colocando dinheiro no meio. Lembro de um amigo meu da escola que nunca devolvia o dinheiro que pegava emprestado, mas quando emprestava para alguém, sabia cobrar bem direitinho. Talvez ele fosse apenas um mão de vaca, sei lá. O fato é que o dinheiro é especialista em mostrar o pior lado da gente. Não que eu seja um daqueles mentirosos que dizem que não ligam pra isso. Dinheiro é muito bom, sim, mas, por mais clichê que possa parecer, não compra caráter nem felicidade de ninguém.

Sabe aquela velha história do pobre que fica rico e não sabe como lidar com isso? Não volta mais às origens, esquece quem é, de onde veio e de todas as pessoas que o ajudaram a chegar onde está. Passa por cima de um e de outro, mas nem se dá conta disso. O dinheiro já ocupa demais sua visão. Alguns acabam sozinhos com suas fortunas, outros perdem tudo por não saber administrá-la. Enfim, de uma forma ou de outra a vida ensina que o vazio dentro da gente não tem valor nenhum que preencha. Pena que uns demoram demoram tempo demais para aprender.

A maioria de nós costuma usar uma série de proteções e molduras para nos mostrar. Não deixamos que os outros nos vejam por completo, se aprofundem muito, se permitam mergulhar nas nossas profundezas... E se tem uma coisa que o dinheiro faz melhor do que comprar é destruir todos esses escudos. E isso não tem só o lado mal, não. Já conheci algumas pessoas muito boas com dinheiro na mão. Elas mostram que seu valor excede muito à sua conta bancária, pois sabem que se um dia ela se esvaziar, ainda poderão se encher com verdade, amor e certeza de que conhecem o que realmente importa. São pessoas interessantes, daquelas que invadem a alma da gente, seja com um papo legal ou um olhar verdadeiro. Que falam de música, literatura, de fé, de sentimento, ou de coisa qualquer que as interesse, pois não estão interessadas apenas em enriquecer. Pessoas com coração cheio, que, mesmo que estejam de bolsos vazios, encantam por ser exatamente quem são.

Quem muito se preocupa em encher a conta no banco, acaba ficando com a alma vazia. As pessoas com alma cheia não precisam se esconder atrás de rótulos, máscaras, lentes ou fortunas. Simplesmente sabem sob que perspectiva enxergar o mundo. Sabem que precisam de gente, não de objetos. Sabem que são mais que números, são carne e osso. Não têm sede de poder, mas de verdade. Sabem quem é de mentira. Sabem que a vida não tem preço. São raras, sim senhor, mas existem. Estão misturadas em todas as classes sociais. Contam o dinheiro no final do mês e, independente de serem milhões ou apenas um salário mínimo, sabem que o que carregam na carteira é só mais um atalho para dias melhores. O resto da viagem é por conta do que carregam dentro de si.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Um menino, sua avó, sonhos, um caderno e uma escrivaninha

Uma breve apresentação:
  • O menino: se chamava Pedro, era ansioso, astuto e criativo. Tinha muita pressa, embora fosse apenas uma criança. Vislumbrava a vida que um dia haveria de ter, esquecendo de viver sua meninice. Menino de poucas palavras e menos amigos ainda. Preferia ficar sozinho, lendo um livro, desenhando ou apenas conversando com sua avó sobre a vida, o futuro e seus sonhos.
  • A avó: Dona Ilda, ao contrário do neto, era calma, profunda. Aquele tipo de pessoa que lê a alma da gente. Seu olhar acalmava, seu abraço era doce e quentinho. Se preocupava com a ambição do neto, pois sabia que quanto maior o salto, maior a queda.
  • Os sonhos: alguns daqueles que todo menino tem na infância
  • O caderno: capa preta, páginas já um pouco amareladas pelo tempo. Foi um presente de Ilda para Pedro.
  • A escrivaninha: só mais um móvel antigo, sobre o qual Pedro se debruçava para desenhar.
Entrou correndo em casa, animado para mostrar o passarinho amarelo que estava na varanda. Dona Ilda ficou feliz em ver que coisas simples como um canário, a grama verdinha e a folhagem ainda encantavam seu neto. A meninice brincou por alguns instantes nos olhos dela, enquanto lembrava de quando brincava no jardim de casa. É lindo, disse ela, colocando a cabeça para fora da janela. Pedro sorriu timidamente. Sentou-se na escrivaninha da sala e, com algumas canetadas rápidas, desenhou o pássaro no caderno preto.   "Perfeito!", pensou, olhando para o passarinho na folha amarelada. Abraçou-o com força contra o peito.

Queria poder ser o maior desenhista do mundo um dia, mas as pessoas o falavam que desenhar não era bem uma profissão. Diziam que ele deveria ser médico, advogado, contador ou alguma dessas coisas chatas de adulto. Insistia que ia ser um desenhista muito rico, enquanto riam e afagavam sua cabeça. Sua avó dizia que ele podia ser o que quiser. Ah, ela parecia saber tudo o tempo todo, como quem lia um manual para vida. "Meu filho, a maior riqueza está dentro de você", dizia ao dar um beijo de boa noite no neto. Ele apenas balançava a cabeça dizendo que sim, embora não entendesse bem o que isso queria dizer.

Muitos desenhos, primaveras e sonhos depois, Pedro já não era mais um garoto. Sabe como é, todo mundo cresce e vai mudando ao longo do caminho. Não tinha mais avó. Morava com a esposa e filhos em uma casa linda, daquelas onde queria morar quando criança. Tinha quartos sobrando e várias plantas na varanda, onde os passarinhos pousavam e cantavam todas as manhãs. Ele não tinha mais o tempo que um dia tivera para os observar, mas ainda gostava de os ouvir cantar. Não era desenhista, mas podia desenhar no seu caderno nos finais de semana. Tinha uma família e precisava que cuidar dela, por isso escolheu um emprego que os sustentasse.

A vovó estava certa, afinal. Olhou para o céu, olhou para si e deu um largo sorriso. Rabiscou no caderno um cara feliz. Soube exatamente quem ele era naquele momento. Não era alguém de feitos grandiosos, não era um desenhista e definitivamente não havia se tornado o homem que um dia sonhou ser, mas teve uma sabedoria que muitos não tem: soube usar o seu coração, antes que a vida ou algum engraçadinho o fizesse. Afinal, ele era sua maior riqueza.

terça-feira, 2 de abril de 2013

A mudança e nossas interpretações

Quando eu tinha 7 anos, tive que mudar de cidade. Saí de onde eu nasci, de onde minha família toda morava e vim para uma capital menor com meus pais, a mais de 600 km de lá. Nós fomos morar em uma casa grande, num bairro mais simples, totalmente diferente do lugar onde eu morava, que era perto do shopping, do hospital e da farmácia. Os meus vizinhos moravam em casinhas menores, muitos eram humildes e não tinha nenhuma escola particular lá perto. Meus pais diziam que seria por pouco tempo, mas na verdade eu gostava de morar lá. Eu nunca tinha morado em uma casa antes, tinha um terraço espaçoso, muito lugar pra brincar. Tinha um cajueiro lá. Eu achava engraçado ter minha própria árvore. Cheguei na escola nova no meio do ano, sem conhecer ninguém, mas logo estava amiga de todo mundo. Tudo era tão fácil! Olhando pra trás eu vejo que me adaptei muito rápido. Alguns meses depois, nos mudamos para um bairro mais nobre, pertinho da praia. Eu também nunca tinha morado perto do mar. Achei que seria legal, embora estivesse voltando a morar em um apartamento, onde eu não tinha terraço, nem muito espaço, nem árvore. Tinha piscina, então pra mim pareceu uma boa troca. Eu nem notava que tudo estava mudando de novo, simplesmente deixava que tudo acontecesse, afinal, eu não tinha escolha. Era apenas uma menina. Mas tudo isso me faz pensar: por que tenho tanto medo de mudanças hoje? Eu estou familiarizada com elas. Então por que qualquer mínimo detalhe parece tão importante agora? Em cada fase da minha vida eu dei uma interpretação diferente para as mudanças, mas por que antes parecia tão mais fácil? A maturidade não deveria me ajudar a lidar com as situações mais facilmente? Fico confusa por saber que sou muito presa àquilo que me cerca, mesmo sabendo que podem não estar mais lá da noite pro dia. Eu não tenho controle sobre nada, nem mesmo sobre meus sentimentos. Eu sei, agora, que toda essa reviravolta teve que acontecer para fazer de mim quem eu sou hoje. E outras que possam vir vão servir de instrumento para que eu seja o melhor que posso ser.